sexta-feira, 28 de maio de 2021
VALSINHA; CHICO BUARQUE E VINÍCIOS DE MORAES.
VALSINHA
Um dia ele chegou tão diferente
Do seu jeito de sempre chegar
Olhou-a de um jeito muito mais quente
Do que sempre costumava olhar
E não maldisse a vida tanto
Quanto era seu jeito de sempre falar
E nem deixou-a só num canto
Pra seu grande espanto, convidou-a pra rodar
E então ela se fez bonita
Como há muito tempo não queria ousar
Com seu vestido decotado
Cheirando a guardado de tanto esperar
Depois os dois deram-se os braços
Como há muito tempo não se usava dar
E cheios de ternura e graça
Foram para a praça e começaram a se abraçar
E ali dançaram tanta dança
Que a vizinhança toda despertou
E foi tanta felicidade
Que toda cidade se iluminou
E foram tantos beijos loucos
Tantos gritos roucos como não se ouvia mais
Que o mundo compreendeu
E o dia amanheceu em paz
Composição: Chico Buarque / Vinícius de Moraes.
Essa peça de Chico e Vinícius, composta na década de 70, foi uma dedicatória ao movimento hippie que vinha ganhando força. Os hippies daquela época pregavam o amor, a fraternidade, a liberdade de ação em plena época de forte repressão, viviam em grupos, usavam e abusavam do livre sexo e tudo mais.
Dá pra perceber direitinho essa alusão ao movimento quando a música nos apresenta um homem que chega diferente, que olha diferente, que pára de maldizer a vida, que dança que ama.
Combinando características de narração e descrição, sob a forma de enunciados que vão se alternando. Essa alternância se manifesta por meio dos tempos verbais pretérito perfeito e imperfeito do indicativo, contrapondo a ação (que se desenrola em um determinado momento do passado) a um estado anterior (descrito por meio do pretérito imperfeito do indicativo). O objetivo do texto é apresentar uma transformação, inicialmente no personagem masculino, e, consequentemente, no personagem feminino, emblemáticos da relação entre o homem e a mulher, na nossa sociedade.
Desse modo, consideramos os processos de manipulação da linguagem que permitem a quem fala ou escreve sugerir conteúdos emotivos e intuitivos por meio das palavras. Além disso, almejamos estabelecer princípios capazes de explicar as escolhas particulares feitas por indivíduos e grupos sociais no que se refere ao uso da língua, mais propriamente da linguagem literária e estilística de cada autor, na expressividade delas, isto é, a sua capacidade de transfundir emoção e sugestionar os nossos pensamentos, ideias, valores e comportamentos literários, históricos, sociais, políticos, ideológicos, sociológicos e filosóficos.
É a quarta composição da dupla Vinicius-Chico, uma parceria ansiosamente desejada pelo poetinha, porém difícil de se formar por serem os parceiros mais letristas do que melodistas.
A princípio a música iria levar o nome de “Valsa hippie”, por idéia de Vinícius. Chico até aprovou de início, mas logo retrucou, alegando que o movimento vinha virando ‘modinha’. Então, Vinícius demasiadamente Vinícius, como tem a mania de colocar tudo no diminutivo… “Tá,Valsinha, então”.
Em 1970, Vinicius compôs essa valsa e entregou-a ao Chico, que logo fez-lhe a letra e passou a cantá-la em seus shows. Então, o poeta escreveu-lhe uma carta elogiosa, mas que propunha várias modificações, uma delas sobre o último verso da citada estrofe: "E nem deixou-a só num canto, pra seu grande espanto, disse vamos nos amar". Embora declarando-se "embananado", Chico teve firmeza para contestar o mestre, rejeitando a maior parte das sugestões, como a do verso em questão, assim justificando-se:
"Esse homem da primeira estrofe (...) nunca soube o que é poesia (...) e está de saco cheio. Quer dizer, nesse dia ele chegou diferente, não maldisse a vida tanto e convidou-a "pra rodar..." CONVIDOU-A PRA RODAR, eu gosto muito, poeta, deixa ficar (...) rodar que é dar um passeio e é dançar. Se ele já for convidando a coitada para amar, perde-se o suspense e o tesão" para a transa final.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário